quinta-feira, 2 de julho de 2015

O Povo do Livro e da Palavra

Pequeno judeu observado por Rabino e seu Livro

  Contando com apenas 0,2% da população mundial e 2% da população americana, os judeus ganharam 22% de todos os Prêmios Nobel, 20% das Medalhas Fields para matemáticos e 67% das Medalhas John Clarke Bates para economistas com menos de 40 anos. Judeus também ganharam 38% de todos os prêmios Oscar para melhor diretor, 20% dos Pullitzer Prizes para não-ficção e 13% dos Grammy Lifetime Achievement Awards.
  Essas informações constam em uma nota de rodapé do livro Civilization, de Niall Ferguson, de 2011. Desde então, judeus acumularam mais alguns desses prêmios. Além disso, Israel, com apenas 8 milhões de habitantes, é a grande locomotiva mundial quando o assunto é tecnologia, e possui mais empresas listadas no Nasdaq do que toda a Comunidade Europeia junta.
Diante desses dados, o leitor pode concluir que os judeus fazem parte de um grande complô mundial, uma conspiração planetária que os coloca no domínio de tudo, como queriam os antissemitas que produziram Os Protocolos do Sábio de Sião; ou então que eles possuem uma inegável superioridade genética. Não aprecio nenhuma das duas alternativas, e fico com uma terceira, mais plausível: o ambiente cultural do judaísmo é um fator de diferenciação que abre certa vantagem na hora de competir no mercado.

  Eventual vantagem não seria apenas ou principalmente aspecto religioso, muito menos genético, e sim cultural. No princípio era o verbo, e desde então também. O conteúdo verbal, transmitido de geração em geração, é o que forma esse continuum único, que sempre serviu como cola para unir os hebreus e lhes transmitir certas características interessantes.

  Viria do legado das palavras de antepassados a inspiração para explicar a continuidade judaica, reconhecem que uma das características mais marcantes desse legado é justamente a ousadia de questionar, de inovar, e isso faz toda a diferença. Não só os judeus foram historicamente mais alfabetizados, por depositar grande importância na palavra, como eram questionadores e adoravam um bom debate.
  “Nenhuma civilização antiga”, escreveu Mordecai Kaplan, “pode oferecer um paralelo comparável em intensidade com a insistência do judaísmo em ensinar os jovens e inculcar neles as tradições e costumes de seu povo”.
  Judeus aprendem desde cedo a perguntar, questionar. No Talmude, uma opinião inteligente de um jovem às vezes prevalecia sobre a de seu mestre. Um bom aluno deve ser livre para criticar seu mestre. No judaísmo, os alunos eram encorajados a se erguer contra o professor, discordar dele, tentar provar que ele estava errado.
  Como povo exilado, os judeus compreenderam cedo que precisavam transmitir a memória nacional em forma de textos, o que permitiu esse foco na educação.
  Enquanto outras culturas tratavam as crianças como “puras”, vendo inocência na ignorância, os judeus eram mais realistas e sabiam que crianças não eram anjos, e que precisavam ser aculturadas.
Bebê manuseando livro

Essa educação baseada em perguntas era espirituosa, tratava de ideias, encorajava a curiosidade e exigia leitura.


  A propensão a discutir e o humor geram aquele outro traço judaico, que é a irreverência. Bom exemplo dela, foi quando um repórter da BBC perguntou a um rabino de Jerusalém qual a sensação de rezar pela paz entre judeus e árabes no Muro Ocidental (das lamentações) nos últimos trinta anos, e ele respondeu: “É como falar com um muro de tijolos”.

  Sem valorizar o martírio ou a morte, e sim a vida e a sobrevivência, até porque os judeus já tinham sofrido o suficiente com o exílio e as perseguições. Isso alimentava a esperança, o desejo de superação, e tudo por meio da educação formal, da leitura dos livros sagrados. Foi assim que os judeus preservaram sua civilização, mas uma civilização viva, aberta ao questionamento, ao novo, com disputas infindáveis de diferentes interpretações. Bastam três judeus para termos quatro opiniões diferentes, diz a “piada”.
  Se há uma razão para o relativo sucesso dos judeus, talvez a explicação esteja aí: nessa obsessão pela palavra, nesse incrível legado transmitido por meio da educação. O Povo do Livro, como é dito. No princípio era o verbo. E desde então continua sendo…
Rabinos em momento de leitura coletiva

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